Ouviravida retoma as atividades na Vila Pinto

Publicado em: 04/09/2017

Com patrocínio da Dufrio, por meio de financiamento do Pró-Cultura RS, da Secretaria de Estado da Cultura, projeto Ouviravida – Educação Musical Popular está de volta, após dez anos, com aulas gratuitas para 180 crianças do bairro Bom Jesus, em Porto Alegre 

Projeto Ouviravida: aula de canto para crianças da Vila Pinto

Projeto Ouviravida: aula de canto, flauta doce, percussão e prática de conjunto para crianças da Vila Pinto, bairro Bom Jesus, em Porto Alegre. Foto: Sofia Cortese

O Projeto Ouviravida – Educação Musical Popular está de volta. Após dez anos parado, a iniciativa que nasceu em 1999 e oportunizou o ensino de música para mais de 600 crianças, está retomando as atividades. A partir deste mês, 180 crianças da Vila Pinto, no Bairro Bom Jesus, em Porto Alegre, passarão a frequentar aulas de gratuitas de percussão, canto, flauta doce e prática de conjunto. As aulas ocorrem na própria comunidade, no Centro São José – entidade beneficente que atende crianças e jovens no turno inverso ao da escola.

O projeto é dirigido pelo maestro Tiago Flores e tem a coordenação pedagógica de Nisiane Franklin. Os professores são Daiana Fülber (canto e prática de conjunto), Lucas Kinoshita (percussão) e Isac Costa (flauta doce). A retomada do Ouviravida foi possível graças ao patrocínio da Dufrio, por meio de financiamento do Pró-Cultura RS, da Secretaria de Estado da Cultura.

Idealizado pelo maestro Tiago Flores, que na época era maestro da Ospa, o Ouviravida esteve ativo entre 1999 e 2007 com o objetivo de promover o ensino gratuito de música em comunidades em situação de vulnerabilidade social e econômica. Atuava nas cidades de Porto Alegre (Vila Pinto – Bom Jesus), Alvorada (Umbu) e Gravataí (Morada do Vale -Fase III). Depois, por falta de apoio, o projeto teve de encerrar suas atividades.

Trabalhávamos com esses bairros por terem altos índices de violência e tráfico de drogas, pois o objetivo era exatamente este: levar a música para aqueles que mais precisam de atenção”, explica Tiago Flores.

O objetivo agora é dar continuidade.

Eu sempre quis retomar. E agora que conseguimos, queremos começar e não parar mais, pois o grande efeito deste projeto é a longo prazo e não podemos deixar as crianças desamparadas”, reforça o maestro.

Segundo ele, os benefícios do estudo da música são muitos, mas começam a aparecer depois de algum tempo: melhora a concentração e o desempenho das crianças em fase escolar, trabalha a coordenação motora e a autoestima.

Essa é uma das questões mais fortes desse projeto, que é mexer na autoestima das crianças e trabalhar a cidadania. A música faz com que os alunos se sintam confiantes para irem bem na escola, para encararem desafios profissionais e serem protagonistas na sociedade, trabalhando a criatividade, a autonomia e a livre expressão através da arte. ”

Lucas Kinoshita da aulas de percussão. Foto: Sofia Cortese

Lucas Kinoshita da aulas de percussão. Foto: Sofia Cortese

Projeto pedagógico

A linha pedagógica do Ouviravida está baseada em três pilares: execução, apreciação e criação. Ou seja: além de aprenderem um instrumento, os alunos terão momentos para a escuta musical com o objetivo de desenvolverem o senso crítico; e ainda serão estimulados a interferirem no fazer artístico, de forma que possam se expressar, deixando de ser meros executantes para trabalharem também a composição. 

O Ouviravida é um projeto de formação em todos os sentidos. Primeiramente musical, para capacitá-los caso queiram seguir a música como uma opção profissional. Mas também formação como cidadãos, como seres de relação saudável um com outro e com a vida. Por isso que se trata de um projeto de formação integral e continuada”, pontua Nisiane Franklin.

Para fortalecer a noção de pertencimento cultural dos alunos, o Ouviravida também levará os jovens a atividades culturais musicais que acontecem em Porto Alegre, como concertos e recitais a cada três meses.

Próximos anos

Tiago Flores já planeja os rumos do Ouviravida para os próximos anos.

“A primeira etapa é trabalhar a base de musicalização, a leitura musical, experimentação de instrumentos e canto. Depois, introduziremos repertórios mais complexos, para desenvolver os alunos dentro de sua área de preferência. Depois disso, imagino ampliar o projeto, contemplando também instrumentos de cordas e sopro. Na sequência, podemos formar uma orquestra com esses jovens da Vila Pinto e, quem sabe, ampliar as atividades para outros bairros e cidades”, vislumbra.

Vila Pinto

O bairro Bom Jesus, que até 2014 era um dos quatro Territórios de Paz da cidade de Porto Alegre, é uma região de vulnerabilidade social, possuindo altos índices de violência, criminalidade e homicídios. Possui crescimento urbano acelerado, problemas ambientais e sociais, comunidade em situação de risco, ocupação irregular de área, dificuldades de infraestrutura, saneamento, desemprego e exclusão social. 

ISAC COSTA: DE ALUNO A PROFESSOR DO OUVIRAVIDA

Isac Costa Soares é um exemplo do papel transformador do Ouviravida. Ele foi aluno, seguiu carreira e hoje é um dos professores do projeto.

Isac Costa começou a estudar música no Ouviravida, quando tinha 14 anos

De aluno a professor: Isac Costa começou a estudar música no Ouviravida, quando tinha 14 anos. Hoje é professor pelo projeto e dá aula de flauta doce para 180 crianças da Vila Pinto. Foto: Sofia Cortese

Isac começou no Ouviravida em 2003, com 14 anos, com aulas no bairro Umbu – na época um dos mais violentos de Alvorada. “No primeiro dia que eu fiz aula de flauta eu já sabia que queria aquilo pra minha vida”, recorda.

Por conta disso, Isac estudava bastante. Tanto que, logo no primeiro frequentando o projeto, ele passou do grupo de iniciantes para o avançado e ainda foi aprovado na seleção para a Escola de Música da Ospa.

Depois, seguiu os estudos e concluiu o curso de licenciatura em Música no Ipa. E agora, em 2017, foi convidado para integrar o grupo de professores, nesta nova fase do Oviravida.

Poder voltar e ser professor do projeto é muito gratificante e realizador. Eu estou muito feliz e muito animado. Porque eu sei que esse tipo de ação dá resultado. Eu tenho colegas meus do Ouviravida que seguiram. Um deles está fazendo flauta doce na UFRGS; tem um que está na França e tem envolvimento com várias artes; e outro que trabalha com educação musical. E dessa leva, eu fui o primeiro a me formar em música. Inclusive, eu sou o primeiro da minha família a conseguir fazer uma faculdade”, conta.

Para além do ensino de música, Isac reforça o papel social do Ouviravida.

Naquela época eu achava que a única realidade que existia era morar no bairro onde eu morava. O Ouviravida me deu a oportunidade de ver que existia um mundo mais amplo. E hoje, quando estou dando aula, eu fico me colocando no lugar deles. A realidade que os alunos vivem é o que é posto pra eles. E é difícil de eles imaginarem que há uma possibilidade de mudança.

Hoje, Isac estuda trompete no Conservatório Pablo Komlós (Escola de música da OSPA) e integra o Grupo de pesquisa Educação Musical e Cotidiano (Ufrgs). Apresenta-se em eventos, participa da Orquestra de Sopros de Novo Hamburgo e já tocou com orquestras como a Ospa, a Sinfônica de Gramado, Orquestra da PUCRS e Banda Municipal de Porto Alegre. Também atua como professor particular de música.

PROFESSORES | EQUIPE

Nise Franklin (Coordenadora Pedagógica)

Mestre em Educação Musical pelo Programa de Pós Graduação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Coordenadora do Curso de Licenciatura em Música da Universidade Metodista do Sul IPA. Professora de piano, musicalização, prática de conjunto e de teoria e percepção musical na Casa Elétrica, espaço de saúde, educação e cultura. Integra os espetáculos Pitocando, um espetáculo de música para crianças e Cirandô, música brasileira de raiz.

DAIANA FÜLBER (professora de canto e prática de conjunto)

Teve seus estudos musicais em flauta doce e canto coral desde a infância. Em 2001 deu início a prática de estudos de trompete fazendo parte do projeto Sinos Acorda na Unisinos em São Leopoldo e participando também da Orquestra de Sopros Eintracht, de Campo Bom. Em 2006 ingressou no curso de Regência Coral da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e no mesmo período foi regente auxiliar do Coro de Câmara Ars Vocalis em Porto Alegre.  Desde 2009 vem desenvolvendo um trabalho forte com coros juvenis e grupos de musicalização em projetos sociais como o Projari de Guaíba e Vida com Arte da Unisinos, destacando a regência da Orquestra Jovem do Projeto, do Coro Allegro Unisinos.

LUCAS KINOSHITA (professor de percussão)

Formado em Licenciatura em música pelo IPA, é responsável técnico da Kiko Ferraz Studios e produtor musical. Foi diretor de percussões do documentário “O Grande Tambor” (que conta a história do tambor sopapo) e atua como baterista e junto das bandas Trem Imperial, Arthur de Faria e Orkestra do Kaos, Orquestra de Câmera da Ulbra, dentre outros. Atuou como professor de musicalização, percussão e bateria nas escolas Espaço de Criação Musical, Bateras Beat e no Projeto Ouviravida-Gravataí. Comanda uma produtora de nome Tamborearte e com ela realizou duas edições da Llamada Porto Alegre, trazendo a cultura dos tambores afro-uruguayos para capital do RS. Foi produtor do disco Mais Tambor Menos Motor de Richard Serraria, do disco Novo de Alexandre Vieira e do disco Bailado de Orestes Dornelles.

ISAC COSTA SOARES (professor de flauta doce)

Iniciou seus estudos musicais aos 14 anos de idade no projeto OUVIRAVIDA, tendo aulas de flauta doce, canto coral e percussão. Atualmente é licenciado em música pelo IPA, estuda no Conservatório Pablo Komlós (Escola de música da OSPA) e integra o Grupo de pesquisa Educação Musical e Cotidiano (Ufrgs).

TIAGO FLORES (idealizador e coordenador do projeto)

Graduado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul sob a orientação de Arlindo Teixeira. Especializou-se em regência orquestral em São Petersburgo (Rússia) com Victor Fedotov. Participou de cursos, oficinas e festivais com Kurt Redel  e Lutero Rodrigues e venceu o concurso Jovens Regentes promovido pela Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (OSPA). Como regente convidado atuou à frente de orquestras como Filarmonica de Montevidéu (Uruguai), Orquestra de Câmara de Caracas (Venezuela), Orquestra Sinfônica do Estado do México (México), Solistas de Napoli (Itália), Orquestra Sinfônica de Grosseto (Itália), Kaerten Sinphonie Orchestra (Áustria) e Orquestra de Câmara da Lituânia. No Brasil regeu a Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional (Brasília), Orquestra Sinfônica do Paraná, Orquestra Sinfônica da Bahia, Orquestra Sinfônica de Campinas, Orquestra de Câmara de Blumenau, Orquestra Sinfônica da UCS, Orquestra de Câmara Eleazar de Carvalho (Fortaleza) e Orquestra Sinfônica do Mato Grosso.

Foi diretor artístico da OSPA nos anos de 1999 a 2001 e 2011 a 2014. Regente da Orquestra de Câmara da ULBRA desde sua fundação, vem recebendo inúmeros elogios da crítica especializada e tendo contribuído, em muito, para o reconhecimento do conjunto como um dos melhores do gênero no país. Recebeu o prêmio Melhores da Cultura 2005, conferido pela Secretaria da Cultura do Estado do Rio Grande do Sul, prêmio Açorianos de Melhor CD Instrumental em 2006, e premio Açorianos de Melhor Espetáculo 2008 com o Show “Beatles – Magical Classical Tour”.

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